O Brasil vai começar a fabricar os primeiros medicamentos biossimilares com tecnologia nacional. Eles são versões mais baratas de drogas biológicas inovadoras, produtos de alto custo que atacam alvos específicos em doenças como câncer, artrite reumatoide e esclerose múltipla. Apesar de representarem, em unidades, apenas 4% das compras do Ministério da Saúde, consomem 32% do orçamento da pasta para remédios.
O lançamento do laboratório BioNovis, no final de março, representa a iniciativa mais adiantada na corrida pelo desenvolvimento de biossimilares no País. Trata-se de uma parceria entre quatro grandes produtoras de genéricos: EMS, Aché, Hypermarcas e União Química. Segundo o secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Carlos Gadelha, a biotecnologia é uma área estratégica para o País. “São produtos de alto conteúdo tecnológico, de alto valor, que a gente tem de desenvolver para ter garantia de acesso à população brasileira.”
Medicamentos biológicos, produzidos por meio de células vivas, são complexos e caros – uma caixa pode custar R$ 8 mil, em especial no caso dos remédios oncológicos mais modernos. Por causa do alto custo, os pacientes têm recorrido à Justiça para obter as drogas quando elas não estão na lista de remédios ofertados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Em 2010, por exemplo, o Ministério da Saúde gastou R$ 132,58 milhões para cumprir decisões judiciais ligadas ao fornecimento de remédios de alto custo, ante R$ 2,24 milhões em 2005.
Segundo Gadelha, a tendência é que os biológicos sejam cada vez mais representativos no mercado farmacêutico: se hoje respondem por 20% do mercado mundial, essa parcela deve atingir até 40% nos próximos anos. O governo já preparou um pacote de incentivos para estimular o mercado nacional e calcula que o País esteja pronto para iniciar a produção em cinco anos.
Mas essa expansão não será simples no Brasil. Em primeiro lugar, a fabricação de um biossimilar só se torna possível quando cai a patente de um medicamento biológico inovador. Além disso, o fato de a produção envolver células vivas faz com que todo o processo seja muito mais elaborado em comparação ao das drogas sintéticas e seus genéricos, lembra o biomédico Fernando De Mora, do Departamento de Farmacologia da Universidade Autônoma de Barcelona. Ele foi consultor para a implantação dos biossimilares na Europa, onde já existem 14 remédios desse tipo em circulação, e esteve no Brasil na semana passada.
“A droga biológica é estruturalmente mais complexa, então é preciso estabelecer um processo refinado para ter certeza de que vai haver um controle adequado da estabilidade do produto e de que essa estabilidade não mude e não coloque o paciente em risco”, diz Mora.
O envolvimento de organismos vivos faz com que esse tipo de medicamento tenha um grande potencial de despertar uma resposta imune no corpo, que entende a substância como estranha. O controle da produção deve levar a um produto que não provoque essa resposta, chamada de imunogenicidade.
É também o caráter biológico que impede que os biossimilares sejam idênticos às drogas biológicas originais, diz o consultor em medicina farmacêutica Valdair Pinto. “Nos genéricos, a substância ativa é idêntica. A demonstração é simples, basta um estudo de bioequivalência. Nos biossimilares, as substâncias ativas não são idênticas. São necessários vários estudos para provar que são similares.”
As diferenças entre biossimilares e genéricos não param por aí: enquanto o desenvolvimento do genérico demora de um a dois anos, com custo a partir de R$500 mil, o biossimilar pode levar até oito anos para ficar pronto e o custo é de, no mínimo, R$100 milhões. Por isso biossimilares custam, no máximo, 30% mais barato do que o inovador. E podem alavancar o desenvolvimento científico no País.
FONTE: ESTADÃO
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